24 de fev. de 2020

A HORA DOS PONTÍFICES


















                         “E nunca acordo deste sonho e nunca durmo. “

                                          Sophia de Mello Breyner Andresen








No passado prodigioso dos portugueses, tudo fazia parte
da Missão Lusíada.

Depois da etapa cumprida com a fundação incomum da
nacionalidade, a epopeia dos Descobrimentos trouxe uma
primeira mundividência à humanidade, fazendo com que
os mares, ao invés de separar, unissem entre si os
continentes e os homens, refazendo todos os mapas e
abrindo novos caminhos materiais e espirituais.

Sobriamente, aquelas primeiras “pontes” sobre os
oceanos não só expandiram e trocaram culturas entre si,
com todos os benefícios civilizacionais mútuos, como
alargaram à escala do planeta a possibilidade espiritual de
uma fraternidade futura, indispensável para servir de
base ao Império do Espírito Santo, por mais longínquo
que estivesse no tempo.

Esse seria o grande objetivo da Missão Lusíada.

No entanto, pouco depois de oferecerem aquela nova
cosmovisão à humanidade, os portugueses acabaram por
desviar para si mesmos o olhar que antes se dirigia ao
infinito, personalizando interesses e propósitos e, desse
modo, comprometendo a Missão universalista que
haviam assumido. E que acabaram por esquecer.

Era este o sentir de um Camões desiludido, que, ainda
antes de Alcácer Quibir, voltava à Pátria e não a
reconhecia:

"No’ mais, Musa, no’ mais, que a lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda e endurecida! ...

O favor com que mais se acende o engenho,
Não no dá a Pátria, não, que está metida
No gosto da cobiça e na rudeza
Duma austera, apagada e vil tristeza."

Estas palavras arrepiantes ainda hoje fazem sentido,
porque o olhar dos portugueses não mais voltou a fixar-se
no infinito e, consequentemente, a Missão Lusíada foi
varrida do empenho e do comprometimento nacional,
engolida no torvelinho dos novos interesses, dominantes
de então para cá; no entanto, por muitos efeitos e
dividendos que aportem, não conseguem extirpar a
“austera, apagada e vil tristeza” que misteriosamente os
acompanha.

Quanto a mim, a verdadeira fatalidade da nossa Pátria
não foi o desastre de Alcácer Quibir, que acabou com a
dinastia de Avis e com a independência de Portugal
durante sessenta anos; não foram, tampouco, as invasões
napoleónicas, ocorridas dois séculos depois, nem, mais
recentemente, a ditadura de Salazar e a tragédia da
guerra colonial... Muito pior, mais profundo e
contundente que todos os outros, foi o golpe sinistro
dirigido à Alma da nação, eliminando a Missão Lusíada e
deixando os portugueses sem memória.

Fernando Pessoa ao desvelar a identidade do Encoberto
como o Cristo cumprindo a Segunda Vinda, anunciada e
descrita por S. João no Livro do Apocalipse, tornou
também claro quais as forças que se opunham à Missão
Lusíada e à instauração do Quinto Império:
evidentemente, as do “anti- Cristo”, também ali
enunciadas. São forças supinamente inteligentes, que
pretendem fazer crer que não existem, que são mera
fantasia e que, como tal, não precisam ser combatidas;
atuam sobre o lado emocional e mental dos seres
humanos, estabelecendo como principal objetivo o
intelecto, do qual se apoderam e, subtilmente,
manipulam.

Devo esclarecer que a mente humana é um instrumento
precioso, aperfeiçoado durante milhões de anos e
extremamente útil no caminho evolutivo da humanidade.
Mas quando, sob a influência daquelas forças, passa de
instrumento a “instrumentalizadora” e se faz identidade
última do ser, torna-se no principal obstáculo do caminho
espiritual, pois oculta e interdita o caminho para o que é
realmente divino: Alma e Espírito.

No seu tempo, espraiando-se ainda pelo presente,
Fernando Pessoa tentou despertar a consciência perdida,
utilizando a poesia como ponte para a Alma.
 Não é de admirar que a principal oposição às
suas propostas tenha vindo da mente dos portugueses. A
sua qualidade poética foi intelectualmente celebrada e
reconhecida, mas o conteúdo foi admitido apenas como
“liberdade poética”, esbarrando, logo após, num muro de
racionalidade impenetrável. Portanto, tudo o que o genial
poeta conseguiu fazer foi deixar uma “Mensagem”,
recordando aos portugueses quem eram e o que deles se
esperava, mas as suas palavras não encontraram eco
significativo num país que cada vez mais se afundava no
nevoeiro.

E na degradação do sagrado.

Nos nossos dias, Sophia de Mello Breyner Andresen
utilizou igualmente a poesia para descrever a letalidade
do tempo presente:

“Este é o tempo
Da selva mais obscura
Até o ar azul se tornou grades
E a luz do sol se tornou impura

Esta é a noite
Densa de chacais
Pesada de amargura
Este é o tempo em que os homens renunciam. “

Mas mesmo quando os homens renunciam, a chama do
Espírito que levam dentro não se extingue; poderá estar
encerrada no mais fundo do ser, sob capas sucessivas do
mais compacto concretismo, mas, mesmo assim, brilha e
nenhum poder conseguirá apagá-la – poderá ignorá-la,
aprisioná-la, esquecê-la ou repudiá-la, mas nunca apagá-la.

Ora o que sucede no plano humano, sucede igualmente
ao nível da nação: o Espírito português poderá ter sido
ignorado, esquecido, debilitado, repudiado... mas a sua
chama ilumina o abismo em que o colocaram! E para a
recuperar, recuperando igualmente a Missão Lusíada, só
poderão ser, de novo, os portugueses a quererem travar
e vencer essa demanda; individual ou solitariamente,
passo a passo ou combate a combate, porque a nação se
encontra voltada para outros destinos e confinada a
outros valores.

Disse Fernando Pessoa:

“As nações todas são mistérios
Cada uma é todo o mundo a sós. “

Aqueles que, agora, tomarem para si o confronto terão
que ser “todo o mundo a sós” para, um dia, serem de
novo nação e sementes de uma nova humanidade.

Não haverá muitos, porque o Corpo da nação foi
contaminado e a sua desintoxicação será lenta. Mas esses
poucos atuarão em nome de todos os outros, como
sucedia com cada nau que partia à Descoberta e que
consigo levava Portugal inteiro; não se trata, pois, de uma
questão de número – aliás, os discípulos do Cristo eram
somente doze, assim como os Cavaleiros da Távola
Redonda, e Gandhi enfrentou sozinho o Império
britânico.

Mais uma vez, o campo de batalha será a mente, que
resiste ferozmente a deixar o homem descobrir que há
outros mundos de consciência e de criatividade para além
dela. Mas recordo que todas as coisas verdadeiramente
importantes como o amor, a beleza ou a alegria, surgem
de planos acima, pois provêm daquele estado de Ser ou
condição “Eu Sou”, que é a verdadeira natureza de cada
um, o seu Eu profundo, eterno e omnipresente.

A mente aplica todo o seu poder em ocultar esta verdade
libertadora, distraindo-nos com o ruído contínuo dos
pensamentos que esgotam a força vital, a fim de
prosseguir, sem qualquer oposição, no comando da vida
de cada um. E o drama é esse mesmo: não só vamos na
finta, como nos identificamos em absoluto com o intelecto,
que nos diz que somos o que pensamos e que nada mais
existe.

Eckhart Tolle escreveu, muito apropriadamente, que “o
filósofo Descartes julgou haver encontrado a verdade
fundamental quando enunciou o seu famoso aforismo:
“Penso, logo existo. ” De fato, expressou o erro mais
básico: equiparar o pensamento com o Ser e a identidade
com o pensar.”

E aclara: “a mente é um instrumento
soberbo se for usada corretamente; no entanto, se a
usarmos de forma incorreta, torna-se destrutiva. Melhor
dizendo, não se trata tanto da utilização errada da mente
– geralmente, não a usamos, mas é ela que nos usa a nós:
essa é a doença. Acreditamos que somos a nossa mente:
esse é o engano. O instrumento apoderou-se de nós. “

Foi o que sucedeu aos portugueses, que passaram de
descobridores de mundos a vagarem sem rumo por um
outro mar de insalubre nevoeiro, onde desapareceu a
Missão Lusíada. Mas agora entrámos já num outro
tempo, em que as portas de um novo ciclo da história do
mundo terão que ser abertas pelos “encarregados” de tal
Missão: os Lusíadas.

“E eu tenho de partir para saber
Quem sou, para saber qual é o nome
Do profundo existir que me consome
Neste país de névoa e de não ser.”

Estas outras palavras de Sophia espelham o sentimento
de angústia e o apelo à descoberta que levou aqueles
poucos portugueses, mesmo sem muita consciência do
ato, a recomeçarem a olhar para dentro de si mesmos e a
descobrirem caminhos internos que lhes haviam
garantido que não existiam. Conforme sigam ou não
esses caminhos e o processo a eles associado (porque o
esforço de formação e transformação terá que ser
sempre do próprio e a consciência somente será dada a
quem, por si mesmo, a alcançou...), poderão auto
converter-se numa espécie de “guerreiros do Espírito
Santo” e serem eles os pioneiros que vão resgatar o
Espírito de Portugal e retomar a Missão Lusíada.

Ao assumi-lo, poderão também testemunhar que, afinal,
o Quinto Império, o sebastianismo espiritual e a
manifestação do Cristo Encoberto não são utopias ou
sonhos fictícios e enganosos, mas correspondem ao
objetivo mais profundo e verdadeiro do “projeto
espiritual” que fez nascer o nosso país. E mais: que foram
mentes, essas sim, obscuramente dirigidas, que criaram o
nevoeiro que ainda hoje envolve Portugal.


                                      ***

Muito significativamente, desde que Portugal foi
constituído como nação, que os portugueses atribuíram a
São Miguel Arcanjo a essência espiritual que os guia e
protege. Na lenda lusitana do milagre de Ourique, foi o
Arcanjo Miguel, ladeando a figura do próprio Cristo, que
anunciou a Afonso Henriques a vitória sobre os
muçulmanos, viabilizando, desse modo, a formação do
reino de Portugal. Ora, segundo o Livro do Apocalipse,
Miguel é o chefe dos exércitos celestes que, na batalha
final, derrotam as forças do “anti-Cristo”, também
nomeadas no Livro como sendo as de Satã, liderando os
anjos rebeldes.

Ao ser Custódio do Reino, São Miguel Arcanjo representa
o seu Espírito, estimulando a Alma que animou a Missão
Lusíada e vivificou o Corpo da nação, de onde saíram os
cavaleiros que fundaram Portugal e os navegadores que
levaram o seu estandarte pelos mares fora...

Esta trindade original – Corpo, Alma Espírito – foi
seriamente comprometida pelos padrões racionalistas: o
Espírito ficou isolado e bloqueado pelo assédio constante
das mentes positivistas, ficando separado da Alma e do
Corpo; a Alma, perdendo a ligação com o Espirito,
igualmente se perdeu na mesma voragem, enquanto o
Corpo, sem ânimo e sem propósito, se tornou vagante e
ineficaz, deambulando pelo nevoeiro.

E todo o processo ficou desfeito.

No entanto, porque a demanda em questão, mais do que
portuguesa, é universal e se aproximavam tempos de
mudança, tornava-se imperiosa uma estratégia que
restabelecesse a trindade geratriz e motora do processo.
Suponho que, nas condições atuais, só haveria uma coisa
a fazer: despertar o tal punhado de “guerreiros” que
rompessem o bloqueio e reatassem a ligação com o
Espírito condutor e, simultaneamente, procurar uma
Alma gémea e um Corpo compatível, substituindo os
ausentes.

Mas quem sabe se essas supostas alterações não
estariam já contempladas no “plano original”? ...

De acordo com a nova “estratégia lusíada”, a Alma gémea
que se encontrava há muito preparada para refazer
aquela unidade chama-se Galiza; ou seja, não
propriamente a Galiza visível, mas aquele “estado ou
qualidade do ser” que tem por exterior a Galiza e com
quem Portugal partilhou o berço. As duas nações
compartilharam a mesma energia e inúmeras vezes foi
tentado retomar a unidade que, internamente, nunca se
perdeu. De ambos os lados da fronteira continua a
utilizar-se a palavra “saudade”, como que lamentando
não haver uma correspondência física daquela comunhão
espiritual e no mítico castelo de Guimarães foi colocada
uma placa de homenagem à cultura luso-galaica, com
citações de dois expoentes daquela cultura – uma de
Fernando Pessoa: “A minha Pátria é a Língua Portuguesa”
e outra do galego Alfonso Castelao: “A nossa Língua
floresce em Portugal. “

Claro que se trata de uma comunhão espiritual, da qual
se não devem retirar dividendos políticos, pois o que está
em causa é a busca da Alma gémea e uma atuação a esse
mesmo nível.

Quanto ao novo Corpo, tenho para mim que será o do
Brasil, ou por outra, aquilo que o Brasil
etereamente alberga: a pujança e a vitalidade de um
mundo novo, ainda em pleno processo de criação, com as
“doenças infantis” inerentes à sua condição, mas onde
tudo ainda poderá ser feito e naturalmente acontecer, de
acordo com a Providência divina, isto é, sem adulterar o
“plano original” como ocorreu com Portugal e, afinal, com
a Europa, que se tornaram sinónimos do velho mundo.

Ou, melhor dizendo, da velha Europa, mas com uma
  contribuição inigualável na história do Homem e da
Civilização, de que ainda é índice e suporte. No entanto,
creio que estamos à beira de um tempo absolutamente
novo e que necessita de novos suportes vitais; um tempo,
enfim, em que, no caso lusitano, o velho Portugal consiga
passar o testemunho a si próprio, mas num corpo
renovado pois, como disse Agostinho da Silva, “o Brasil é
Portugal, não irmão ou filho de Portugal, mas Portugal
mesmo. “

Acrescentaria eu que o Brasil é aquele Portugal que não
chegou completamente a ser, mas que, deste outro
modo, será...

Curiosamente, Portugal, Galiza e Brasil passam,
atualmente, por problemas graves, todos relacionados
com a sua identidade: Portugal, como já descrevi, perdeu-se no nevoeiro,
virou a proa à Europa e, prontamente, encalhou. Para cúmulo, esqueceu-se
ou, muito pior, renunciou a quem era, à sua verdadeira identidade
espiritual; a Galiza faz parte de uma Espanha cuja unidade
territorial foi posta em causa com as pretensões
separatistas da Catalunha, e o Brasil ainda se não refez do
“terramoto” provocado pela corrupção ao mais alto nível,
enquanto a violência nas principais cidades atinge índices
de guerra civil.

Sobre o Brasil, adjunto o que pessoalmente constatei: a
grande maioria da população do Brasil, vítima maior
desta mal sana situação, possui, não obstante, uma
candura, uma alegria e uma jovialidade inabaláveis, que
lhe advêm de uma confiança ilimitada no divino,
totalmente aberta a todas as tendências. Essa pluralidade
franca e livre reflete-se numa convivência naturalmente
fraterna, impregnada de pureza e com a inocência de um
menino... E não é um Menino a figura central do Culto do
Império do Espírito Santo, que o povo brasileiro tomou
para si e que amorosamente abraça, preserva e defende?

A reconstituição da trindade lusíada – Corpo, Alma
Espírito – pressupõe a criação de uma Pátria metafísica
engrandecida, ainda que com as suas conformidades no
mundo e que, deste modo, também corresponde à da
“Língua Portuguesa”, como Fernando Pessoa dizia que
seria a sua. E a que Agostinho da Silva acrescentava: “Do
retângulo da Europa passámos para algo totalmente
diferente. Agora, Portugal é todo o território de língua
portuguesa. (…). Quando se diz ter Portugal de fazer
alguma coisa, o que tem de ser feito sê-lo-á por todos os
homens de língua portuguesa. ”

Aquela Pátria servirá de base ao Império do Espírito
Santo, pois este também pertencerá, um dia, a este
mundo. A um outro ciclo, mas a este mundo. Obviamente
que, quando surgir tal Império, todas as pátrias serão
apenas “identidades culturais” ou “estados de
consciência”, pois naquele mundo futuro não haverá mais
fronteiras a dividi-las.

A instauração daquela Pátria abstrata e transcendente,
com correspondência na face da Terra, poderá ocorrer
em simultâneo com a nossa própria restruturação
individual, pois ambos os trabalhos terão que partir de
uma base interna, profunda e espiritual.

Uma vez mais, trata-se de construir uma ponte por cima
dos precipícios criados pela mente concreta, para
conseguirmos chegar ao âmago de nós mesmos; dali,
levantaremos uma outra que nos conduza à génese da
nação portuguesa, de modo a podermos trazer para o
presente o que foi esquecido do passado, transportando
igualmente para o “aqui e agora” o futuro sonhado; todos
são partes constituintes de um modelo único e atemporal
que designamos como Império do Espírito Santo ou
Quinto Império.

Não importa se aquele Império se encontra perto ou a
milénios de distância, o que penso que mais conta, agora,
são as Novas Descobertas ou a construção de novas
pontes, já não ligando continentes na face da Terra, mas
sim dimensões ou planos internos, transmitindo uma
mundividência descrita de dentro para fora e uma nova
antropogénese. Portanto, esta já é, sem dúvida alguma, a
hora dos pontífices.

Assim sendo, poderemos mais facilmente visualizar o
acesso àquele modelo Quinto Imperial como o atravessar
de uma ponte mágica, que não liga um local a outro, mas
a Humanidade ao seu Destino. O plano dessa ponte é
português, os pilares levantados pela Galiza e o tabuleiro
ou pavimento construído pelo Brasil.

Ao conceber a questão deste modo, poderemos contatar diretamente
com as energias daqueles três vértices, podendo juntar às
nossas aquelas outras forças inteiramente “lusíadas”,
ainda que provenientes da América do Sul ou de uma
outra parte da Ibéria.

Por isso, esta também é a hora dos “novos Lusíadas”, que
serão todos aqueles que responderem ao apelo redentor
interno e se consagrarem à renovação e cumprimento
final da respetiva Missão.

Isto significa que poderão ser pessoas anónimas que se
reencontraram consigo próprias, no mais íntimo do seu
ser e colocaram em ordem o seu interior, convertendo-se,
desse modo, em guerreiros espirituais do presente,
tão impecáveis como os anteriores, reconhecendo em si
mesmos a vibração da Pátria Lusíada como base espiritual
e física para o advento do Império do Espirito Santo.

Acredito que sejam, fundamentalmente, portugueses,
brasileiros, galegos ou de outra zona da Ibéria... Mas
também poderão provir de qualquer outra parte do
mundo, pois o mais importante é a identidade espiritual,
o alinhamento com o propósito em causa, os valores do
coração e uma vontade plena.

E, evidentemente, que sejam exímios construtores de
pontes.

A ponte em questão será, obviamente, uma ponte de
consciência e, ao iniciarmos a travessia, poderemos,
desde logo, constatar um fato extraordinário: ainda que
haja múltiplas tarefas e caminhos a cumprir por fora (a
Missão Lusíada sempre deteve uma componente
pragmática na face da Terra), tudo se resolverá, primeiro,
pelo lado de dentro, sob a direção do “Eu maior” de cada
um. Deste modo, cada um será o Sumo Pontífice de si
próprio e ninguém terá que seguir ninguém, nem
depender de messias ou gurus, de religiões ou de
hierarquias, de grupos, seitas ou instituições, sejam quais
forem. Teremos apenas que nos alinhar conosco mesmos,
com aquele “Eu Sou” que somos deveras, para
distinguirmos o caminho e atravessar para o outro lado.

Na verdade, não se trata de nenhum processo novo, nem
de nenhum milagre ou forma de magia (embora o ato de
viver constitua, só por si, um milagre e a maior de todas
as magias...), mas apenas recordar o que foi esquecido,
reativando um conhecimento inerente a cada célula do
corpo. Também o mundo em redor poderá parecer o
mesmo, mas não é, nem nunca mais será o mesmo.

Estaremos a avançar decididamente sobre o tabuleiro da
ponte, por dentro de nós mesmos, deixando para trás
todos os medos, angústias e expectativas, e não importa
se conseguimos, desde logo, distinguir o vulto do
Cavaleiro Encoberto por entre o nevoeiro que ainda
envolve partes do caminho, ou as primícias do Império do
Espírito Santo a brilharem ao longe, na outra margem.

Porque, de súbito, estaremos lá.

E seremos tudo.